26 de jul. de 2010

Escritor, um "garimpeiro" das palavras (Leidiane Montfort)

Ofício por vezes desvalorizado, é ele o responsável por preservar o conteúdo para as futuras gerações
"O escritor é um leitor de si mesmo". Assim a poetisa e escritora Marta Helena Cocco, em meio a um bate-papo informal, disparou sobre o ofício de escritor - que nas palavras da também escritora e crítica literária Yasmin Nadaf se caracteriza sob todas as formas como o de um "garimpeiro da palavra". E, é essa figura emblemática e ao mesmo tempo relevante no processo de produção de subjetividade que é dedicada a data de hoje: 25 de julho, dia do escritor.
Encanto e medo, desejo e preconceito, o glamour visto no cinema e na TV contrasta com as infinitas horas em frente ao computador, a crítica ácida feita por si próprio, ou mesmo a ansiedade com a opinião de seus leitores. A vida de escritor não é simples, apesar de em grande parte do imaginário popular ela mostrar alguém tranquilo e olhar perdido esperando a inspiração vir do alto, do mar, do céu.
O estereótipo de um escritor com uma máquina de escrever (ou na versão atualizada um laptop) em frente a um cenário paradisíaco buscando inspiração para seu ofício não condiz com a realidade. "Pelo menos não para a maioria que se aventura a escrever. Com raras exceções isso acontece. Geralmente só os vendedores de best-sellers conseguem viver exclusivamente da escrita. Os escritores atuais são os que têm outras profissões para se sustentar financeiramente. Há poucos que aceitam viver só da escrita e encarar o alto risco que o ato imprime- o que porventura possa incluir o risco da marginalidade social, como Ricardo Guilherme Dicke aceitou", afirma Marta Helena Cocco, gaúcha, mestre em Estudos de Linguagem pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), autora de cinco livros, entre eles O Ensino da Literatura Produzida em Mato Grosso- regionalismo e identidade- e ainda o livro de poesias Sete Dias.
Necessidade- Por que escrever? "A alma pede. É algo que não sei se existe explicação. É uma necessidade, um desejo. O ato de comunicar, interagir com o outro vem desde nossa mais antiga ancestralidade e mais do que a mensagem oralizada ou cantada, a escrita é uma das técnicas que mais fascina pela característica de conseguir perenizar o nosso pensamento e preservar o conteúdo para gerações futuras", declara Marta.
Para ser escritor é preciso ser um leitor compulsivo, acredita a escritora. "Digo leitor no sentido mais amplo da palavra: leitor de livros, mas também de momentos, sensações, situações. Uma pessoa com uma sensibilidade mais aflorada. Uma alma mais aberta para as expressões da vida".
O argumento é também endossado por Yasmim Nadaf, cuiabana, crítica literária, doutora em Literaturas de Língua Portuguesa, pela Unesp, pós-doutora em Literatura comparada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e integrante da Academia Mato- Grossense de Letras. "O escritor é um aprendiz. Ele traz em seu ofício diálogos múltiplos (...) Escrevo, porque não saberia fazer outra coisa".
"Desde os 15 anos faço críticas literárias. Sou uma leitora de berço. As duas ações (ler e escrever) estão fortemente entrelaçadas. Já nasci com esse olhar. Com uma inquietude particular. Um desejo de me posicionar criticamente frente à realidade que enxergo. Acredito na literatura como objeto de transformação. De aparar diferenças, sejam mínimas ou não, na sociedade", aponta a escritora.
"Há também importante parcela de emoção no que escrevemos, seja prosa ou poesia. O escritor é um leitor de si mesmo. Ele mostra o repertório de leitura acumulada. Nós lemos sempre com a nossa bagagem particular. E isso está em constante mudança", define Marta Cocco.
A "garimpeira de palavras" e crítica literária Yasmim Nadaf acredita que para ser um escritor respeitado, qualidade é essencial. "Nesse processo de busca por novos autores é preciso que se valorizem os bons escritores. Sou apaixonada por Cuiabá e por Mato Grosso, mas não acho que se deva valorizar esse ou aquele escritor porque ele é de nossa terra e sim pela qualidade de seus escritos. A divulgação precisa acontecer com quem tem qualidade. É preciso ter critério".

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